APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO. ELETROBRÁS. OBRIGAÇÕES AO PORTADOR. DEBÊNTURES. SOCIEDADE ANÔNIMA. SUBMISSÃO À LEI DAS S/A. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. INAPLICABILIDADE. CRÉDITO DE NATUREZA CÍVEL. APLICAÇÃO DO ARTIGO 177 DO CÓDIGO CIVIL DE 1.916 C/C O ARTIGO 2.028 DO ATUAL. EXAME DO MÉRITO. ARTIGO 515, § 3º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. CORREÇÃO MONETÁRIA PLENA. CONSIDERAÇÃO DOS EVENTUAIS EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. JUROS CONFORME ESTIPULADOS NO TÍTULO.
1. De acordo com seu estatuto social, a Eletrobrás é sociedade anônima, submetida aos termos da Lei 3.890-A/61 e às normas aplicáveis às sociedades por ações.
2. Desse modo, a Eletrobrás, conquanto entidade integrante da Administração Pública Federal indireta, sujeita-se, por força da lei que a instituiu, ao disposto na Lei de Sociedades Anônimas, qual seja, Lei 6.404/76 e atualizações.
3. Atentando-se para o disposto na Lei 6.404, capítulo V, no que se refere às debêntures, tem-se que suas características coadunam-se perfeitamente aos títulos emitidos pela Eletrobrás, sob a rubrica de "obrigações".
4. O excerto do disposto no verso dos títulos apresentados coaduna-se ao teor do artigo 59, e incisos, da Lei 6.404, que trata da criação e emissão das debêntures, em especial: deliberação da assembléia geral; valor da emissão, determinação do limite e divisão das debêntures em séries; número e valor nominal e as condições de correção monetária; época e condições vencimento, amortização ou resgate dos títulos.
5. Revela-se totalmente incabível que uma empresa, submetida ao regime das sociedades por ações, possa, com respaldo legal, emitir títulos com flagrante natureza de debêntures sob a denominação de "obrigações", no intuito de fazer valer regime jurídico diverso da Lei das S/A, do modo que lhe pareça mais favorável, em detrimento de prejuízos ao consumidor.
6. Não aplicável, portanto, o prazo prescricional de cinco anos, seja o previsto no Decreto-lei nº 20.910/32, seja o disposto no artigo 168 do Código Tributário Nacional, pois, além de tratar-se de empresa submetida ao rito das sociedades anônimas, as obrigações assumidas por esta frente aos consumidores de energia elétrica constituem espécie de título de crédito e não de natureza tributária.
7. De tal sorte, findo o prazo para resgate das obrigações-debêntures como previsto no título, de vinte anos, surgiu para a Apelante o direito de ação para resgate do crédito, de natureza cível, suscetível ao prazo prescricional previsto no artigo 177 do Código Civil de 1.916 c/c o artigo 2.028 do atual diploma.
8. In casu, se o prazo estabelecido pela combinação dos artigos referidos era vintenário e acrescentável ao prazo também de vinte anos disposto nos títulos para resgate das obrigações, o termo ad quem para o ajuizamento da presente demanda se configuraria em 31/12/2009 para um e em 31/12/2011 para outro.
9. Ajuizada a demanda em 27/09/2004, não se vislumbra a ocorrência do fenômeno prescricional, dinâmica que justifica o afastamento desta prejudicial de mérito.
10. Encontrando-se o feito suficientemente instruído, permite-se a análise do mérito nesta instância recursal, em conformidade com o previsto no artigo 515, § 3º, do Código de Processo Civil.
11. A conduta de caráter confiscatório da Administração é rechaçada pelo ordenamento jurídico pátrio. Desse modo, impedir que a correção monetária e os juros sobre os valores pagos a título de empréstimo compulsório só se verifiquem a partir de determinado período, é lesar o consumidor que, apesar de haver emprestado certa quantia, terá direito de ser restituído apenas em parte do que desembolsou.
12. Logo, e de acordo com entendimento pacificado pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, é devida ao consumidor correção monetária sobre os valores atualizados dos títulos de maneira integral e calculados até a data do efetivo resgate, considerando-se, ainda, os expurgos inflacionários relativos aos diversos períodos econômicos e de mudança de moeda, nos termos e índices em que assentados pelo STJ.
12. No mesmo sentido, os juros são devidos desde a arrecadação compulsória e devem ser calculados à proporção de 6% (seis por cento) ao ano, conforme disposto nos próprios títulos.
13. DEU-SE PROVIMENTO ao recurso da Autora para, com a mais respeitosa vênia à douta magistrada, tornar a r. sentença sem efeito e afastar a ocorrência da prescrição. Com fulcro no artigo 515, § 3º, do Código de Processo Civil, JULGOU-SE PROCEDENTE o pedido inicial para condenar a ELETROBRÁS - Centrais Elétricas Brasileiras S/A ao pagamento em favor da Autora dos valores constantes dos títulos, atualizados, com juros de 6% (seis por cento) ao ano e correção monetária, devidos a partir do recolhimento compulsório feito pela Ré, observados, ainda, os expurgos inflacionários nos índices em que assentado pelo colendo Superior Tribunal de Justiça. Extinguiu-se o processo com resolução de mérito, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, condenando-se a Ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, a ser apurado quando da liquidação da presente, com base no artigo 20, § 4º, do mesmo diploma legal.
(20040110923485APC, Relator FLAVIO ROSTIROLA, 1ª Turma Cível, julgado em 26/08/2009, DJ 08/09/2009 p. 51)
Fonte TJDF