O planejamento estratégico do Poder Judiciário tem sido uma das prioridades do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em especial desde o ano passado, quando o órgão estabeleceu metas de nivelamento a serem seguidas por todos os tribunais do país. A iniciativa de planejar colheu resultados positivos, apresentados no 3º Encontro Nacional do Poder Judiciário, ocorrido em fevereiro, em São Paulo.
No balanço do esforço de efetividade judicial de 2009, a Justiça do Trabalho apresentou números expressivos. Na mais polêmica das metas de 2009, que estabelecia o julgamento de todos os processos distribuídos até dezembro de 2005, a Justiça do Trabalho ficou à frente do índice global de 58,79%.
Nos 1º e 2º graus, o índice de sucesso foi de 93%, o que equivaleu a 98.364 processos julgados até fevereiro deste ano. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) também mostrou resultado positivo, com 50.828 processos julgados até 31 de dezembro de 2009, o que representou um percentual de 91%.
Agora, temos novas metas de nivelamento e uma delas merece especial atenção. Será uma das prioridades do Poder Judiciário em 2010 reduzir, em pelo menos 10%, o acervo de processo na fase de cumprimento ou de execução e, em 20%, o acervo de execuções fiscais.
Trata-se de uma importante inovação no conjunto de metas, pois não se busca apenas dinamizar o julgamento das causas, com aptidão para apontar para a sociedade que as sentenças proferidas pelos magistrados serão, efetivamente, cumpridas e não teremos apenas uma proclamação de direitos.
Mas, para se alcançar essa meta prioritária, precisamos implementar várias mudanças. Primeiro, é necessário oferecer ao corpo da magistratura trabalhista as condições para se dedicar com mais vagar à execução, máxime porque também está presente, para 2010, meta de julgamento de processos (desta feita até 2007).
Não podemos esquecer, ainda, que muitas são as realidades na Justiça do Trabalho brasileira, regionalizada em 24 tribunais. Em alguns tribunais regionais, as metas devem ser flexibilizadas, sob pena de esgotamento físico e psicológico dos magistrados.
O desafio aqui é avançar na execução com a mesma produtividade que a Justiça do Trabalho tem apresentado na primeira parte da caminhada processual, representada pela instrução e coleta das provas até a sentença.
Para isso, defendemos um amplo debate institucional, a fim de que essas metas se harmonizem e avancem, sem prejuízo, por suposto, de uma prestação jurisdicional de qualidade e da própria qualidade de vida dos juízes, que hoje já apresentam trabalho em intensidade elevada e preocupantes níveis de stress ocupacional.
Nesse processo, é também indispensável uma revisão da atual estrutura e gestão de pessoas. Sem a logística e o pessoal necessários, prejudica-se, e muito, qualquer expectativa de avanço na execução.Por isso, preocupa a magistratura do Trabalho a não inclusão - no rol das metas para 2010 - de proposta de concentração de, pelo menos, 75% da força de trabalho na atividade-fim do Poder Judiciário.
Fixada apenas como recomendação, essa providência é fundamental para se lograr qualquer êxito junto aos órgãos jurisdicionais, pois não é possível eficiência no cumprimento da sentença sem o necessário apoio de pessoal.
Essa nova meta é, portanto, um grande desafio para os juízes trabalhistas. A palavra-chave para a prestação jurisdicional eficaz e de qualidade é equilíbrio, sob pena de termos uma celeridade contraproducente e inerte. Decisões conferidas rapidamente, mas sem a sua efetivação num prazo razoável. Precisamos, definitivamente, sanar esse desequilíbrio na cadência da marcha processual.
Estatísticas do Conselho Nacional de Justiça ilustram essa necessária mudança cultural. O relatório "Justiça em Números", referente ao ano de 2008, mostra que a Justiça do Trabalho, na fase de conhecimento, apresenta índices de congestionamento inferiores aos obtidos na fase de execução: são 34,1% contra 59,6%. E estamos falando de um universo de seis milhões de processos que foram julgados naquele ano, incluindo os casos pendentes dos anos anteriores.
Há de se reconhecer que, historicamente, há um vanguardismo cultural que impulsiona a execução na Justiça do Trabalho, fato esse explicado pelo privilégio do crédito trabalhista. O instituto do ofício da execução, descrito no artigo 878 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) - "a execução poderá ser promovida por qualquer interessado, ou ´ex officio´, pelo próprio juiz ou presidente ou tribunal competente" - também é outro ponto de destaque na construção desse protagonismo".
O juiz do trabalho dispõe hoje de diversas ferramentas eletrônicas, em especial o Bacenjud, para o auxílio à efetivação da execução. A penhora eletrônica é, sem dúvida, uma grande aliada da magistratura trabalhista, mas, isoladamente, não tem logrado êxito em todos os casos. Isso porque os devedores têm se dedicado sobremaneira a buscar mecanismos para ocultar os seus patrimônios da Justiça. Exemplo disso é a profusão no uso dos chamados "laranjas".
A mudança no Código de Processo Civil (CPC) é outro ponto que merece um melhor aprofundamento. Se as mudanças do código deram maior visibilidade à questão da execução, o mesmo não pode ser dito da compreensão efetiva de que essas melhorias podem e devem, subsidiariamente, ser observadas pelo processo do trabalho.
Situação semelhante aplica-se às mudanças da Teoria Geral do Processo. O processo trabalhista não é uma ilha isolada e pode se comunicar com outras fontes do processo e caminhar para a construção da jurisprudência.
E essa mudança de conduta é uma alternativa para as dificuldades que os projetos de reforma do processo trabalhista enviados ao Congresso Nacional têm em sua tramitação.
É necessário também um avanço com relação à incorporação dos direitos fundamentais no campo processual. A Constituição Federal, lei maior de nosso país, deve ser o nosso grande referencial.
Princípios como o do acesso à Justiça e o da duração razoável do processo devem ser considerados em seu potencial normativo e conformador da ordem procedimental infraconstitucional.
O momento exige uma mudança de paradigma, que signifique um maior aprofundamento dos operadores de direito com questões fundamentais que fazem sim do processo mais complexo, porém mais efetivo e que concretiza os direitos pleiteados à Justiça. O bom juiz tem o dever de usar todas ferramentas à sua disposição para dar uma resposta efetiva à sociedade.
Precisamos combater o formalismo, o legalismo, pensarmos de forma progressista, termos um cuidadoso novo olhar para a execução trabalhista. A Justiça do Trabalho agradece e a sociedade também.
(*) juiz trabalhista e presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra)
Fonte: Valor Econômico, por Luciano Athayde Chaves(*), 05.04.2010