A aplicação ao processo do trabalho da multa prevista no artigo 475-J, do Código de Processo Civil, é tema dos mais debatidos na Justiça do Trabalho mineira. Em recente julgamento realizado na Vara do Trabalho de Teófilo Otoni, o juiz titular Hitler Eustásio Machado Oliveira manifestou o seu posicionamento acerca da matéria.
De acordo com o entendimento expresso na sentença, esse dispositivo legal pode ser aplicado como apoio ao processo do trabalho, por ser compatível com a legislação trabalhista.
“Se a regra processual civil se apresenta mais eficaz no caso, mais moderna, compatível e afeta aos interesses e princípios do processo laboral, deve prevalecer diante da norma celetista, ultrapassada e em descompasso com a busca da maior celeridade e efetividade da prestação jurisdicional” – enfatizou o julgador.
O artigo 475-J do CPC estabelece que: "Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no artigo 614, inciso II desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação".
O magistrado esclareceu que o processo trabalhista tem norma específica regulando a matéria, estabelecida no artigo 880 e seguintes da CLT. Inclusive, o artigo 883 dispõe que, em caso de não pagamento dentro do prazo legal, ocorrerá a penhora dos bens, mas não estipula nenhuma multa em virtude do atraso.
Sendo assim, apesar de existir regra própria na CLT sobre o tema, o juiz considera que esses dispositivos legais não são suficientes para disciplinar a matéria de forma completa. Isso porque falta um detalhe essencial: a estipulação de uma multa nos casos de atraso ou descumprimento da obrigação trabalhista.
Conforme explicou o magistrado, esse tipo de lacuna normativa é conhecido como lacuna axiológica, ontológica ou ideológica. Em outras palavras, a norma existe, mas deixa de atender à sua finalidade de forma satisfatória e não acompanha a evolução do ordenamento jurídico e da demanda social.
Ainda que se entenda de forma diferente, o julgador chama a atenção para o princípio da aplicação da norma mais favorável ao empregado, previsto no artigo 7º, da Constituição, que determina a aplicação da regra mais vantajosa ao empregado sempre que houver conflito entre normas que regulam a mesma matéria.
Nesse sentido, o juiz considera que a regra do artigo 475-J é mais vantajosa ao empregado, na medida em que desestimula o descumprimento das obrigações trabalhistas e garante a rapidez no andamento dos processos, ajudando a colocar em prática outro princípio constitucional, consagrado no inciso LXXVIII, do artigo 5º, da Constituição, o qual assegura aos litigantes o direito à duração razoável do processo.
Além disso, lembrou o magistrado que esse é o entendimento dominante no TRT mineiro, expresso em sua Súmula 30, editada em 11/11/2009, cujo teor é o seguinte: "MULTA DO ART. 475-J DO CPC. APLICABILIDADE AO PROCESSO TRABALHISTA. A multa prevista no artigo 475-J do CPC é aplicável ao processo do trabalho, existindo compatibilidade entre o referido dispositivo legal e a CLT."
No caso analisado pelo juiz, ficou comprovado que o vendedor da Ricardo Eletro Divinópolis era obrigado a usar, no ambiente de trabalho, acessórios ridículos, como peruca de palhaço e óculos em forma de cifrão, com o objetivo de atrair a atenção dos consumidores.
Entendendo que o trabalhador foi vítima de danos morais, o juiz sentenciante deferiu a indenização correspondente, fixada em R$3.000,00, e determinou que a empresa seja intimada para pagamento da dívida trabalhista, em 15 dias, sob pena de inclusão da multa do 475-J. Os recursos das partes ainda serão julgados pelo TRT mineiro.
( RO 00761-2010-077-03-00-0 )
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais, 18.11.2010