Personagem - sem o desejar – de um caso de remuneração vilipendiada, o advogado Carlos Thomaz Ávila Albornoz, 67 de idade, 43 de profissão, também professor de Direito, conselheiro seccional da OAB gaúcha há oito anos e meio, recebeu o Espaço Vital em seu escritório, em Sant´Ana do Livramento (RS).
Durante cerca de meia hora de conversa franca, aquecida pelo chimarrão que ajudou a enfrentar o frio da fronteira, ele relatou como reagiu, em dois momentos, à constatação de que a Justiça gaúcha entendeu que R$ 1 mil reais era a remuneração adequada para o “zelo profissional”, mantendo “a proporcionalidade com o trabalho realizado”.
Albornoz lembrou que não perde a capacidade de indignar-se com o que ocorreu e admite que, se um dia isso eventualmente ocorrer, será o momento de deixar de advogar – coisa que, aliás, ele nunca pretende deixar de fazer.
Nesta entrevista, o advogado conta que a juíza - que lhe fixou os honorários em R$ 1 mil - foi sua aluna e ela deve ter estado “apenas desatenta”, sem ocorrência de preconceito contra a advocacia, até mesmo porque a magistrada tem pai e irmã advogados atuantes.
Albornoz avalia que o julgado da 20ª Câmara Cível que confirmou os R$ 1 mil consubstancia um “menosprezo” à atividade dele e à de seus colegas, modo geral. Mas, confiante, espera reverter a decisão no STJ, além de sugerir a seus colegas que, em casos semelhantes a esse, seja convocada a OAB a intervir na condição de assistente do advogado, ante o risco de prejuízos financeiros e abalos institucionais.
ESPAÇO VITAL - O senhor teve atribuídos honorários sucumbenciais de R$ 1 mil numa causa em que o seu trabalho advocatício – bastante exitoso – obteve uma economia de mais de R$ 1 milhão para sua cliente. Como avalia isso?
CARLOS THOMAZ ÁVILA ALBORNOZ – Em um primeiro momento fiquei chocado pelo teor do acórdão, que tratou a matéria genericamente, sem enfrentar os números colocados na apelação. Quando professor, eu sempre disse aos meus alunos que ´o advogado não pode perder a capacidade de indignação diante a injustiça´. O dia em que isso eventualmente ocorresse comigo seria o momento de deixar de advogar. Felizmente não aconteceu e vencida a estupefação, elaborei – com a participação de minha filha Cristina, que advoga comigo – o recurso especial e já o protocolamos dez das antes do final prazo. Não tenho dúvida alguma que decisões como essa se constituem em uma afronta à dignidade profissional. Acredito que esse deva ser o caminho a ser seguido por todos os que tiverem a verba honorária aviltada.
EV - O senhor é atuante conselheiro seccional da OAB gaúcha. Institucionalmente o que pode a Ordem fazer, diante de tantos casos de honorários irrisórios?
ALBORNOZ - A matéria é uma das bandeiras em que têm se empenhado tanto a OAB-RS quanto o Conselho Federal e inúmeras ações têm sido desenvolvidas. A par disso, desde a gestão Lamachia, com continuidade na gestão Bertoluci, a CDAP, sempre que solicitada, tem feito o acompanhamento de recursos que tratam de honorários. No caso, por entender que a necessidade de provimento ao recurso de apelação era tão aberrante, cometi um erro ao não requerer a assistência da Ordem. Aprendi a lição. É de referir que, na órbita do Conselho Federal, idêntico acompanhamento se dá, por criação da gestão Marcus Vinicius e Claudio Lamachia.
EV - O senhor imagina – como dizem alguns colegas seus – que, mesmo ganhando muito bem, alguns juízes são pessoas enciumadas em relação à advocacia?
ALBORNOZ - Não acredito que haja ciúme, mas creio que existe algo muito mais preocupante. É que alguns juízes e desembargadores não dão o devido valor à atividade profissional do advogado e, em razão disso, aviltam honorários.
EV - A juíza Caren Letícia Pereira – ao atribuir-lhe honorários de R$ 1 mil – definiu que assim o fazia “dado o seu grau de zelo profissional”. Como o senhor comenta essa avaliação feita pela magistrada?
ALBORNOZ - Conheço a juíza doutora Caren, que foi minha aluna na matéria ´Títulos de Crédito´, durante o curso de Direito, no campus de Sant´ Ana do Livramento, da Urcamp. O CPC e a fixação de honorários não fizeram parte do nosso currículo, mas avalio a atribuição de verba irrisória a uma desatenção da magistrada quanto ao alcance dos embargos, do que a um preconceito contra a advocacia, mesmo porque ela tem pai e irmã como advogados atuantes e partícipes das atividades da Subseção de Livramento. Pode ter ocorrido também erro de avaliação ou, até mesmo, de digitação. A sentença que ela proferiu - ao contrário da apelação - não tratava apenas de honorários, mas de matérias de relevante interesse patrimonial que foram providas, como a limitação à garantia outorgada e a redução da multa de 20% para 2%. Na decisão de mérito a sentença da doutora Caren é irretocável. Tanto é assim que não houve sequer recurso da parte vencida. Na peça de apelação, que era específica ao aviltamento da verba honorária, abordei minudentemente os valores envolvidos e, mesmo assim, não consegui sensibilizar os integrantes da 20ª Câmara Cível.
EV - A 20ª Câmara Cível do TJRS ao confirmar a verba de R$ 1 mil afirmou que “os honorários advocatícios devidos pela sucumbência devem guardar proporcionalidade com o trabalho realizado pelo profissional”. Terá o acórdão desejado afirmado que seu trabalho foi pequeno?
ALBORNOZ - Tenho a decisão da 20ª Câmara como um certo menosprezo à atividade profissional do advogado, e não como algo específico a mim, à minha filha que também é advogada, ou contra o nosso trabalho. No processo de execução juntamos nossa procuração no dia 5 de julho de 1999 e temos agido diligentemente na defesa dos interesses de nossa constituinte. No momento próprio, entramos em primeiro grau com os embargos. Eles foram providos praticamente na íntegra. O que nos propusemos a fazer foi obtido na sentença. Mas o valor deferido de R$ 1 mil nos remunera com R$ 62,50 por ano trabalhado – que é o preço de uma refeição em restaurante médio por ano. Porém o irônico, ou trágico, é que quando ajuizada a execução, os executados foram citados e o mandado determinava uma verba de 10% sobre o valor da causa a título de ´honorários para pronto pagamento´, fixados pela juíza que recebeu a execução. Também o princípio da isonomia foi patrolado.
EV - Entre os que confirmaram a verba de R$ 1 mil está um desembargador oriundo do quinto constitucional, em vaga reservada à advocacia. Como advogado e como conselheiro da OAB-RS, o que o senhor pensa disso?
ALBORNOZ - É lamentável. Sou conselheiro da OAB-RS há oito anos e meio. O desembargador Glênio Heckman, presidente da 20ª Câmara Cível, foi escolhido há mais tempo e certamente esqueceu as agruras do dia a dia da advocacia que exerceu. Ou, talvez até por atribuir pouca importância à advocacia, haja migrado para o tribunal.
EV - O que é possível fazer para acabar com essa turra?
ALBORNOZ - O novo CPC, se for obedecido, termina com o problema. Os honorários terão que ser fixados entre 10% e 20% do proveito econômico ou, não sendo possível, do valor atualizado da causa. Além disso, há que recorrer sempre quando os honorários fixados não atenderem aos parâmetros legais ou ferirem a dignidade profissional. E, como já mencionei antes e aqui repito, os advogados prejudicados por honorários sucumbenciais irrisórios devem requerer, no recurso, a assistência da OAB.
Fonte: Espaço Vital