Peço licença à ABACRIM para publicar na íntegra a carta que reflete uma dura realidade que enfrentam os profissionais do direito em todo o Brasil.
A falta de profissionalismo, o autoritarismo de certos magistrados está transformando a vida dos profissionais do direito num verdadeiro tormento.
CARTA DOS ADVOGADOS CRIMINALISTAS BRASILEIROS À NAÇÃO
04.10.2013
Os advogados criminalistas do Brasil, reunidos no seu VI Encontro
Nacional, realizado nos dias 26 e 27 de setembro de 2013, na cidade de
Curitiba, Estado do Paraná, após longa reflexão e intensos debates sobre
as liberdades individuais, garantias processuais penais de índole
constitucional do cidadão e a persecução penal no Estado Democrático de
Direito, deliberaram proclamar à Nação que:
1. A Constituição da República Federativa do Brasil, concebida e
gestada em ambiência plenamente democrática e promulgada por legítima
fonte de poder, estratifica a soberana vontade do povo brasileiro e não
pode ser interpretada de modo a negar seus postulados fundamentais nem
seus princípios perenes a pretexto de se atenderem supostos anseios das
ruas ou conveniências de ocasião. Tem ela a vocação da perma nência e
sua modificação, no que possível, só pode ocorrer por meio do devido
processo legislativo, é dizer, através das emendas constitucionais;
2. As garantias de natureza processual penal positivadas em preceitos
e princípios da Carta Magna são intocáveis posto que resultantes de
refletida e dolorosa elaboração político-institucional, não se mostrando
admissível – antes, é intolerável sua negação, mortificação ou
restrição por via da interpretação pretoriana intencionalmente
direcionada contra seu espírito;
3. Não se admite no nosso sistema democrático a triste figura do
juiz justiceiro que, despindo-se da imparcialidade e abdicando da
necessária equidistância das partes, se transforma em algoz dos acusados
e, sem rebuços, prestigia a hipertrofia dos expedientes acusatórios que
compromete a paridade de armas (parconditio), apanágio da dialética
processual democrática e fator de legitimação da persecução estatal;
4. As deficiências do Poder Judiciário do Brasil, máxime sua
proverbial morosidade, não são devidas à atividade desenvolvida pela
defesa técnica dos réus, que é imposição constitucional, nem pelas
oportunidades de impugnação de ilegalidades e manejo de recursos postos à
sua disposição pela lei. Antes, a lentidão se deve às carências
estruturais que exibe, seu peculiar regime de trabalho e à tenaz
resistência que sempre ofereceu – e segue oferecendo à ampliação de
seus tribunais. Assim é que a criação de novos órgãos jurisdicionais
sempre enfrentou veemente oposição da própria magistratura brasileira ao
argumento de que não se deve vulgarizar cargos e funções judicantes ,
como se a Justiça existisse para os magistrados e não para o povo. Em um
país com mais de duzentos milhões de jurisdicionados, os tribunais e os
juízes existentes são insuficientes para atender à demanda de justiça
contida;
5. Repudiam, com toda ênfase, o fenômeno indesejável do
autoritarismo judiciário que, em postura retrógrada e condenável,
insiste em limitar o espectro do mais democrático, eficaz e ágil
instrumento de defesa da liberdade humana contra abusos e ilegalidades
que é o Habeas Corpus. Essa percepção restritiva, autoritária e
antidemocrática substitui nos dias de hoje o arbítrio outrora posto em
prática por déspotas, tiranos e autocratas, cuja existência mais não tem
lugar nas sociedades livres dos tempos atuais;
6. Denunciam, pois, essa nova fonte de arbítrio que surge no cenário
institucional, originária da burocracia estável do Estado brasileiro,
principalmente do Estado-juiz, que não hesita em imolar centenárias
conquistas libertárias e garantias fundamentais, no altar da
conveniência dos serviços ou da necessidade da racionalização
funcional int erna ;
7. Repudiam, com eloquência, a supressão de instâncias e de recursos
processuais, concebidos como garantia inalienável dos cidadãos ao
fundamento de que é preciso imprimir celeridade à tramitação dos feitos
ou instituir julgamentos de uma só instância;
Como foi ontem, é hoje e será sempre, os advogados criminalistas do
Brasil reafirmam seu inquebrantável compromisso com a liberdade humana e
sua permanente hostilidade a qualquer forma de autoritarismo, tirania
ou desrespeito aos direitos da pessoa, especialmente daquela que se vê
acusada da prática de um delito perante o Estado.
Curitiba, em setembro, 27, 2013.
Associação Brasileira de Advogados Criminalistas Abracrim.
José Roberto Batochio (Pres. Comissão de Redação da Carta) e Luiz Flávio Borges D’Urso (Presidente/ABRACRIM)