A primeira audiência conjunta das associações da
magistratura com o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, foi
realizada em clima tenso ontem (8). O encontro mereceu uma nota de
poucas linhas no saite do Supremo, ao registrar que Nelson Calandra
(presidente da AMB), Nino Toldo (presidente da Ajufe) e João Bosco Coura
(presidente em exercício da Anamatra) “vieram entregar um documento em que apresentam preocupações das entidades”. Ainda segundo a notícia oficial, “no
documento, as entidades fazem referência à política de remuneração dos
magistrados com o intuito de recuperar ‘perdas sofridas pelo subsídio’ e
à necessidade de mudanças no Código Penal e no Código de Processo Penal
para evitar a impunidade”.
Em seu saite, a Ajufe publicou comentário do juiz Toldo, ao final do encontro:
“A
Ajufe, junto com as demais associações de classe da magistratura,
procurou, nessa reunião, estabelecer diálogo com o presidente do Supremo
Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça. Contudo, o clima
tenso da reunião mostra que esse diálogo não será fácil”.
Segundo matéria do jornalista Juliano Basile, do jornal “Valor Econômico“, no
início do encontro Toldo afirmou que a entidade tinha um ofício com
propostas para fortalecer o Judiciário e o Estado de Direito.
Mas Barbosa logo questionou: "Os senhores acham que o Estado de Direito no Brasil está enfraquecido?”.
O próprio presidente do STF afirmou que “nós
temos, seguramente, a mais sólida democracia da América Latina. Me
causa estranheza pedir o fortalecimento das instituições democráticas,
mas, enfim, eu vou ler o documento.”
O jornalista Frederico
Vasconcelos, da Folha de S. Paulo, transcreveu outra das frases do
presidente do STF, dirigindo-se aos magistrados presentes: “Os
senhores não representam o CNJ. Os senhores não representam a nação. São
representantes de classe. Mas eu não vim para debater com os senhores”,
disse Barbosa.
Ele lembrou que entidades de juízes entraram
com ações, no STF, contra o CNJ. Foi quando Calandra alegou que a AMB
entrou com ação para que a Corregedoria do CNJ só atuasse nos casos de
suspeitas contra juízes, após a apuração pelos tribunais. Nessa ação, a
AMB foi derrotada por um voto no STF.
Toldo disse, então, que as associações de juízes apoiam o Conselho Nacional de Justiça. “O CNJ não necessita de apoio”, rebateu Barbosa.
O presidente do STF continuou fechado:
"Os atos do CNJ estão previstos na Constituição e nas leis. A questão
que trazem está superada. O gabinete do STF não é o local para discutir
essas questões".
Barbosa fez uma pausa e questionou: "Vocês têm um documento sobre o quê? É um documento de reivindicações?”.
Antes de ouvir uma resposta, recomendou: “Quando vocês tiveram algo para propor, antes de ir à imprensa, encaminhem à presidência”.
Os presidentes das associações de magistrados lembraram que vinham tentando, há meses, uma audiência com o presidente do STF.
Barbosa comentou, apontando para o presidente da Ajufe. “Eu recebi este senhor”.
“É Nino Toldo, senhor presidente”, respondeu o presidente da Ajufe.
“Não sou obrigado a lembrar o seu nome”, respondeu rispidamente o presidente do STF - ainda segundo o relato do jornalista Frederico Vasconcelos.
O
clima ficou ainda mais pesado quando Barbosa tratou da criação de
quatro novos tribunais regionais federais. O ministro afirmou – segundo a
Ajufe – que as associações teriam “induzido” deputados e senadores a erro, fazendo o Congresso acreditar que a PEC seria benéfica para a população. “Pelo que eu vejo, vocês participaram de maneira sorrateira da aprovação. São responsáveis, na surdina, pela aprovação”, afirmou Barbosa.
O vice-presidente da Ajufe, Ivanir César Ireno, saiu em defesa da associação, segundo informa a entidade: “Sorrateira não! Democraticamente, de forma transparente, republicana. Emitimos nota técnica. Sorrateira em hipótese alguma!”
Barbosa lembrou que ele estava no gabinete da presidência do STF: “Fale baixo. O senhor não foi convidado para essa reunião. Somente dirija a palavra quando eu lhe pedir!”.
O presidente do Supremo comentou com ironia a construção dos novos tribunais: “Tenho certeza de que essas sedes serão construídas em resorts e praias”.
“Em Minas Gerais, não tem praia”, rebateu Toldo.
Barbosa disse, então, que "a
aprovação de novos TRFs foi uma irresponsabilidade, pois deve triplicar
o número de juízes no Brasil - e essa é uma visão corporativa. A
Justiça Federal vem se interiorizando de maneira impensada e irracional.
É um movimento de irresponsabilidade. Eu gostaria de ter sido ouvido
pelo Congresso, e não fui.”
Nino Toldo disse que a Ajufe não
agiu de forma sorrateira e que não aceitava o termo, visto que a Ajufe
sempre agiu de forma clara e transparente, apresentando notas técnicas.
Então Toldo defendeu a promoção dos juízes por merecimento e foi chamado
de “líder sindical” por Barbosa.
Quando Calandra elogiou a atuação de Barbosa no julgamento do mensalão, o presidente da Corte respondeu: “Mas
o STF se prestigia por si próprio. Eu recebo críticas injustas,
infundadas, algumas são feitas com elementos falsos. Mas este é um
tribunal aberto, que delibera em público. Nada ocorre aqui nas sombras.
Estou no STF há dez anos e relatei milhares de processos. Esse processo
foi apenas mais um, o mais retumbante. Agi nesse processo da mesma forma
que em outros. Não houve nada de extraordinário nesse processo em
relação aos demais”, enfatizou Barbosa.
Ao final do encontro, Barbosa advertiu os presidentes das associações:
“Nós não podemos raciocinar com aquilo que é apenas de nossos
interesses. Temos que pensar no interesse de toda a sociedade. E, na
próxima vez, não tragam representantes que não sejam os senhores”, disse aos presidentes das associações.
“Venham apenas os senhores”, pediu, encerrando a reunião.
Fonte: Espaço Vital